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  • Foto do escritorLeonardo Maia

Falso Self: quem eu sou de fato e como viver entre o fake e o real?


Você conhece o conceito de “falso-self”?

Quando alguém diz:

“Estou apenas sendo eu mesmo (a)!”, o quanto de subjetividade de fato há nesta expressão?


Pois é sobre este tema que falaremos neste texto.

Talvez você se identifique ou conheça alguém com estas características, veja a seguir...


No mundo contemporâneo, com suas novas constituições e modos de existir, os perfis recebidos para o tratamento psicológico e psicanalítico mudaram muito desde a época de Freud e, por isso, precisamos acompanhar estes ciclos.


Para entender “como se constrói a identidade” precisamos nos lembrar que, ao longo de várias épocas que caracterizam a história da humanidade, diversas mudanças foram acontecendo, principalmente no que diz respeito à concepção do mundo e da vida, alterando a cada dia a forma como nos vemos e somos vistos.


Até a Idade Média, o nosso jeito de ser era imposto e considerado como “natural”, consequentemente, era visto como estável e não era problematizado. Com o desenvolvimento da ciência, a revolução industrial, a reforma religiosa dentre outros movimentos, novas formas de relações se estabeleceram. Importantes transformações sociais e tecnológicas e um novo olhar acerca do ser humano e a subjetividade inauguraram a modernidade. As alternativas quanto aos modos possíveis de vida se diversificam.


Levar isto em consideração é importante, já que quando ocorre o atravessamento da família, das instituições e da classe social (contidas em uma determinada cultura), o sujeito irá, pelas demandas do ambiente passado a ele, na vida cotidiana, se movimentar por alguns papéis sociais.


E como nós transitamos por tantos papéis diferentes ao longo da nossa vida? Podemos dizer que usamos o “falso self” mais do que imaginamos. O conceito de Falso Self foi desenvolvido por Donald Winnicott, um famoso psiquiatra, psicanalista e pediatra inglês. Ele parte da ideia de Freud de que nosso self é constituído por um núcleo central, controlado por nossos instintos e também por uma outra parte, que é voltada para o exterior e relacionada para o mundo. Winnicott nos traz que, quando usamos o Falso Self, queremos nos proteger, escondendo assim o nosso verdadeiro eu, mostrando apenas o lado que achamos que o outro deve ver para que possamos ser amados.


Porém, algumas vezes, o falso self toma toda a estrutura psicológica da pessoa de uma forma em que ela não se enxerga e não consegue compreender direito quem ela é, já que ela não se identifica com o que faz, vive de forma que não é genuína, sem conseguir ser espontânea, mesmo sendo sempre educada e gentil e isso acaba levando ao adoecimento psíquico.


Assim, “ Enquanto o self verdadeiro é sentido como real, a existência do falso self resulta em uma sensação de irrealidade e em um sentimento de futilidade.” (Winnicott, 1990; pag. 135). Winnicott apresenta o Falso Self em vários níveis, que caminham gradualmente da normalidade- os falsos selfs aceitos e até necessários socialmente, até o adoecimento, chegando a uma total submissão a um sentimento de total vazio, levando a sensação de que não vale a pena viver aquela situação e sendo substituído pelo desejo de desistir.


Então vamos conhecer cinco tipos de Falsos Selfs que observamos na clínica?


1- Falso Self como normalidade:

Nem tudo é sintoma quando falamos de Falso Self. Um exemplo do falso self em termos de funcionamento na saúde: você entra no elevador e a pessoa pergunta: oi, tudo bem? E você responde: oi. Tudo. E na verdade não está. Você não fala: olha, não está tudo bem... tive um dia do cão hoje! Então nesses casos o falso self te ajuda. Apesar de você ter tido um dia “do cão”, você olha para a pessoa sorrindo e diz que está tudo bem. No nosso cotidiano, temos no falso self uma função social de preservação. “O equivalente ao si mesmo verdadeiro no desenvolvimento normal é aquele que se pode desenvolver na criança no sentido das boas maneiras sociais, algo que é adaptável. Na normalidade essas boas maneiras sociais representam uma conciliação.” (Winnicott, 1965), por isso não abrimos aquilo que sentimos verdadeiramente para todos à nossa volta, como uma forma de sermos educados e bem vistos, para sermos amados ou buscando aprovação e socialização.


2- Falso Self como identificação:

Identificar é o mesmo que tornar idem, ou seja, igual. Sabe aquele ditado: diga-me com quem andas, que te direi quem és? Winnicott diz que nós somos capazes de alcançar uma certa identificação com a sociedade, sem perder muito de nossos impulsos individuais ou pessoais. Essa identificação pode ocorrer de tal forma que o indivíduo se enriqueça no contato com o outro, porém pode ameaçar o estabelecimento de uma identidade pessoal caso prevaleça uma defesa para proteger-se do medo de não ser aceito. Em tese isso aconteceria devido ao medo infantil de ser repreendido e rejeitado pelos pais na infância ou por figuras de cuidado. Vemos com frequência comportamentos de identificação nas chamadas “panelinhas” em que as pessoas começam a agir exatamente como a maioria de seu grupo indo, muitas vezes, contra aquilo que realmente acreditamos. Ou seja, em nome da inclusão sacrificamos sempre parte de nossa subjetividade.


3- Falso Self age em busca de encontrar condições ambientais que possibilitem o Self verdadeiro existir:

Durante esse estágio, Winnicott diz que quando alguma coisa não sai como o planejado e uma ameaça aparece, há um alarme interno que faz com que a própria pessoa assuma um grande cuidado consigo mesma. Neste estado de atenção, passa a se ocupar muito de sua proteção para que nada inesperado aconteça ou uma surpresa desagradável recaia sobre si.

Devemos estar atentos ao fato desse cuidado, às vezes, tornar-se um controle rígido da pessoa sobre si e sobre os outros, como aqueles que muitas mães têm sobre seus filhos. Nesta tentativa exagerada de viver em cautela, percebemos em muitos casos, sintomas obsessivos graves que invadem a família ou o grupo. Seria como se todos estivessem com esse “alarme” acionado 24 horas por dia. Esta postura individual ou mesmo grupal, pode levar à um total engessamento da vida, já que quando não nos permitimos arriscar para não nos decepcionarmos, ficamos sempre em uma zona de conforto, perdendo oportunidades e aprendizado que vem da coragem de ousar viver novas situações. Este estado de atenção pode ser melhor trabalhado na terapia por exemplo, com ajuda de um psicólogo o paciente vai desenvolvendo gradativamente a possibilidade de avançar em direção aos seus desejos.


4- O Falso Self está ali, sente o verdadeiro Self potencial e o preserva numa vida secreta:

Nesses casos, apesar de viver no cotidiano imerso em um Falso Self, a pessoa percebe que seu Verdadeiro Self vale a pena. Isso é muito comum, por exemplo, em situações em que uma pessoa segue os passos direcionados pelo outro, como escolha profissional, ou em relacionamentos, por exemplo. Porém, seus reais desejos permanecem protegidos e guardados a sete chaves, dando a impressão de viver uma vida dupla, o que gera uma culpa que faz a pessoa se fechar e ter dificuldades de estabelecer vínculos com alguém que talvez possa descobrir seus reais desejos. Portanto o medo de uma comunicação verdadeira, levaria à um isolamento social que pode não ser saudável e, mais uma vez, visto como uma fuga. O que te impede hoje de viver os seus desejos, talentos e se conectar com seus interesses genuínos? Um trabalho, um relacionamento, sua família ou você mesmo? Pense nisso...


5- O Falso Self usado e tratado como real ocultando o verdadeiro self:

Se a pessoa faz tudo com o intuito de agradar, de conseguir mais amizades e na atualidade mais seguidores e engajamento, tem um sacrifício gigantesco na manifestação de sua espontaneidade. Esse esforço extra para ser aquilo que você não é, traz um sofrimento psicológico e, a longo prazo, o “falso self” prevalece no sentido de um bloqueio e inibição grave da espontaneidade saudável. Precisamos dar limites de vez em quando pois não é todo dia que estamos bem e não é por isso que precisamos fingir que estamos bem! Se você vive em uma hiper exposição, seja pelo trabalho ou pelo estilo de vida que leva, pode ser muito importante encontrar momentos de reclusão e descanso. Isso equilibra novamente os investimentos libidinais e te reconecta com interesses guardados e que não puderam ser satisfeitos.


Como buscar ajuda para saber se somos reais?

Em meio a tanta confusão de sentimentos no nosso dia a dia, nossa vida está repleta de responsabilidades e desafios reais, precisamos desenvolver um ego forte e mais próximo do saudável para driblar as armadilhas da vida em sociedade. Para além disso, reconhecer em nós um Self Verdadeiro e conectado com nossos reais interesses e aspirações pode nos servir como bússola para trilhar nosso caminho. Uma das maneiras de descobrirmos e nos conectarmos com nosso Self Verdadeiro, seria por meio de uma terapia com um profissional habilitado e formado.


No setting terapêutico e pela figura do terapeuta, iremos encontrar um ambiente de confiança e de maior intimidade, fazendo com que o paciente sinta-se seguro e possa expressar suas fantasias, ansiedades e sintomas pois é saindo da rigidez que o indivíduo descobre o eu (self). Na terapia, “[...] o indivíduo pode reunir-se e existir como unidade, não como defesa contra a ansiedade, mas como expressão do EU SOU, eu estou vivo, eu sou eu mesmo. Nesse posicionamento tudo é criativo. (Winnicott, 1975).


Portanto, a clínica psicanalítica na contemporaneidade deve tomar como base o fato de que toda escuta deve ser única, reinventando assim a psicanálise a partir de cada atendimento. Sustentada pela palavra, a clínica atual possibilita novas leituras dos impasses simbólicos dos pacientes e suas transformações.


Se viver é amarração, como nos diz Alberti (1999), estamos vivendo em uma malha de retalhos costurados frouxamente seja com pouca linha ou com linhas falsas. Em última análise, seria em um espaço terapêutico seguro que poderíamos nos permitir um encontro verdadeiro com nosso Self, experimentando a possibilidade de sermos nós mesmos na busca pela completude de um Self real e verdadeiro, em um mundo rodeado de perfis e emoções fakes.


Se ao ler o texto você percebeu que vive algo semelhante ou que alguém próximo vem passando por isso, compartilhe!


A busca por um self saudável deve estar ao alcance de todos e isso traria um benéfico gigantesco para a sociedade. O encontro terapêutico propicia um espaço potencial para a reconstrução de seu mundo interno (dentro) para em seguida se relacionar com o externo (fora)!


Gostaria de mais informações ou de agendar uma entrevista para iniciar uma terapia? Entre em contato e invista no melhor para você.

Siga meu perfil no Instagram: @leonardomaia_psi


Referências:

ALBERTI, S. Viver é amarração. In: Esse sujeito adolescente. Rio de Janeiro: Rios Ambiciosos, 1999.

BRASIL. Comissão Nacional da Verdade. "Tortura". In: Relatório da Comissão Nacional da Verdade. Brasília

ECO, Umberto. Idade Média: bárbaros, cristãos e muçulmanos. Dom Quixote: Lisboa, 2010.

FREUD, Sigmund. Psicologia das massas e análise do eu. Rio de Janeiro: Imago, 1976. (ESB, 18).

PINHEIRO, T. Tornar-se uma outra na histeria e ser uma outra do falso eu. Rev. latinoam. psicopatol. funda. São Paulo, v. 7, n. 1, pág. 9-19, março de 2004.

_____________. Escuta psicanalítica e novas demandas clínicas: sobre a melancolia na contemporaneidade. Psychê - Revista de Psicanálise. São Paulo, ano 6, n. 9, p. 167-176, 2002.

ROCHA, M. COSTA, L. Simulação e Simulacro: A realidade do Big Brother Brasil. Cadernos de Comunicação, 16(1). 2012

WINNICOTT, D.W. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.

_________________. Distorções do ego em termos de falso e verdadeiro self, in Winnicott (1960): O Ambiente e os Processos de Maturação, Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.

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